Resenha do livro “A Carne”
Livro/Romance do Autor Júlio Ribeiro, um clássico do Movimento
Realismo no Brasil, contando com 55 páginas, sendo a obra mais
conhecida e popular deste Autor.
(Contém spoiler)
O livro narra a história de Lenita, filha única de um homem
aristocrata que, em uma tragédia, perde muito cedo a esposa em um
parto mal sucedido, o que o faz cercar a pequena Lenita, sua única
filha fruto desta união, de cuidados excessivos e mimos, optando a
se dedicar exclusivamente à educação da menina e não casar-se
novamente.
A menina cresce muito instruída e culta (fato pouco comum para as
meninas de sua época) e muito “agarrada” ao pai (lembrando ser
um caso de complexo de Electra), e já na idade adulta recusando
todas as propostas de casamento recebidas e rechaçando todos os seus
pretendentes sob o pretexto de não ter o desejo de se casar.
Aliás, o presente Autor usa muito de tais recursos em sua obra,
descrevendo em detalhes fatos embasados em conhecimentos científicos
e psicanalíticos, usando tais teorias como pano de fundo na
construção do enredo e na construção psicológica de seus
personagens, recurso este muito usado por outros autores de sua
época, no Movimento do Realismo.
Subitamente, Lenita perde seu pai
por um mal súbito, o que a deixa transtornada perdendo sua única
referência familiar, levando-a a se mudar para a fazenda de um amigo
de seu pai e tutor, em busca de alento. Ao chegar por lá descobre a
existência de um homem misterioso, quase da idade de seu pai e filho
do Coronel dono da tal fazenda, o que instiga e aguça sua
curiosidade em conhecê-lo, despertando-lhe instintos secretos as
quais ela nunca tivera vivenciado antes.
Ela abandona os livros e os estudos, e passa seus dias a suspirar e
vaguear pela fazenda, a espera da chegada do tal moço, alimentando
idealizações quanto a ele. O tal mancebo porém fora casado e
divorciara-se de uma francesa, o que o proibia, pelas leis
brasileiras da época, a contrair um segundo casamento.
Com a sua chegada a fazenda depois de uma longa caçada, Lenita, de
início contrariada, se depara com um homem relativamente conservado
para sua idade, culto, gentil e instigante, alimentando-lhe ainda
mais seu desejo e instigando-lhe instintos libertinos para uma jovem
e recatada donzela.
Logo ambos descobrem entre si uma
grande afinidade momentânea, com interesses comuns como estudos
intelectuais, as ciências e a caça, o que os faz permanecerem cada
vez mais tempos juntos e afinados, em um frenesi de trocas de
experiências, discussões e andanças à caça pela fazenda, e o
casal de senhores pais de Manuel Barbosa, já idosos e adoentados,
não veem nada de mal nesta aproximação, já que ambos os enxergam
como dois irmãos, ou tio e sobrinha, devido aos laços de amizade e
afeto que mantinham com o falecido pai da moça.
Logo Lenita, vendo-se apaixonada, mostra-se disponível e atraente, e
Manuel, devido a sua diferença de idade (“tenho idade para ser seu
pai”), e sua condição social (divorciado), evita ceder às
investidas da moça, temendo e querendo não prejudicá-la, mas o
tempo é cruel e a aproximação entre ambos vã, o que lhe “quebra”
as resistências, fazendo com que ambos se entreguem a momentos de
uma tórrida e voluptuosa paixão, que alimenta a ambos de desejo e
paixão, não temendo limites, nem sociais, nem familiares, nem
pessoais, transgredindo todas as regras sociais sua época.
Lenita vê em Manuel
momentaneamente [a meu ver] a figura de seu pai, perdida subitamente
com a sua morte prematura; ela procura em Manuel a substituição
daquela figura paterna que lhe oferecia segurança, alento, projeção
e proteção, e por momentos, Manuel lhe preenche psicologicamente
estes requisitos; mas uma gravidez inesperada a faz cair em si e a
repensar suas atitudes, mudando o curso de sua história. Ao
descobrir a gravidez, aproveitando a saída temporária de Manuel da
fazenda em uma viagem para resolver assuntos externos, Lenita, na
calada da noite faz suas malas e, com um breve comunicado avisa ao
Coronel (pai de Manuel e dono da fazenda) que está de mudança para
São Paulo, partindo repentinamente e deixando o pobre velho atônito.
Ela já não mais manifesta desejo por Manuel, julga já não mais
tê-lo amado, e resolve cuidar sozinha de seu filho e dar rumo a seu
destino sem a interferência do mesmo.
Ao retornar da viagem e saber da
mudança repentina de Lenita, Manuel fica consternado, pois constata
estar perdidamente apaixonado por ela e sofre demasiadamente com a
sua ausência, e com sua indiferença para com ele ao partir tão
subitamente.
Dias depois, ele e seu pai recebem cartas de Lenita, comunicando que
esta contrairá matrimônio com um antigo pretendente que reencontrou
em São Paulo. À Manuel ela conta secamente através de uma carta
toda a sua verdade: que está grávida de um filho dele de três
meses, que iria se casar com este homem através de um acordo nupcial
que favorecia a ambos, para poder dar um nome e um futuro a seu
filho, já que Manuel não poderia fazê-lo, por ser considerado
pelas leis brasileiras um homem ainda casado, não podendo contrair
um segundo casamento, e que se mudaria em seguida para a Europa com o
marido logo após a celebração de núpcias.
Consternado, Manuel a chama de “prostituta e rampeira” e
julgando-se passado para trás pela jovem moça, abandonado por esta
e julgando não conseguir mais viver sem seu grande amor, comete
suicídio, ingerindo uma dose letal do veneno cicuta. FIM.
Por Karina Aldrighis.
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